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domingo, 16 de março de 2014

Em Busca de Lenora: Capitulo IV

Enforcando e Esquartejando



Talinthar, uma das mais belas e pacíficas cidades portuárias em todo o Reinado. O silvo das gaivotas que vinham do mar para pairar sobre o mercado de peixes dava um sentimento no coração dos que ali estavam, de paz, sossego e aventura. Mirando através das janelas o horizonte longínquo, os residentes viajavam com seus olhares sobre as ondas querendo desbravar onde a vista não mais alcançava, desvendando as sutis siluetas das ilhas espalhadas pela conhecida Baía dos Náufragos, assim nomeada por séculos atrás os navegantes inexperientes terem seus navios afundados por negligenciarem os inúmeros corais, monstros marinhos e rochedos que assolavam aquelas terras submersas. A cidadela era bem grande para o padrão comum de Hongari, com algumas colinas cercando-a, e muitos humanos marinheiros, assim como halflings comerciantes, compondo sua população nativa. Havia pelo menos um estaleiro e duas docas principais com navios de porte médio, de possível viagem de cabotagem ou que seguiriam até as ilhas da baía, guiados por um grande farol que durante a manhã soltava fumaça da queima de madeira apropriada indicando para aqueles no horizonte a localização da costa, enquanto a noite sinalizava com luzes potentes. O comércio era reunido em uma praça cheia de barracas, frutos do mar que arduamente fediam a céu aberto, pessoas que tumultuavam-se em turba furiosa, algumas lutas informais com competições de apostas, saqueadores de sacolas de tibares incautos e toda sorte de possibilidades que se podia ter em uma cidade-porto humana em um reino próprio dos halflings.

A navegação não era uma prática muito comum nos mares lestes de Arton, havendo poucos marujos e pesquisadores navais, levando muitos amadores desbravarem as ondas apenas como simples comerciantes que iam e vinham com mercadorias e pessoas. O grupo estava sentado no segundo andar de uma taverna bastante badalada por estes escassos aventureiros dos mares, a Cova do John Morto. Lendas locais diziam que o dono da taverna ergueu sobre a tal cova este estabelecimento, o que levava às noites ouvirem passos do navegante John nos corredores, mal sabendo que na verdade eram ratos que faziam barulho, a madeira que rangia e os morcegos agitando-se sob o telhado. Luigi terminou a última nota sob aplausos das raparigas sorridentes e dos homens do mar embriagados que assistiam sua performance, feita em troca de um desconto para a noite a todos os membros caso fosse necessário, pois mesmo tendo a recompensa do prefeito de Lappuh por ter capturado Anne, a peste que vinha aterrorizando a comunidade e carregando algumas crianças que por pouco não formavam um bando de saqueadores, era bom economizar nos gastos.

- Hunc! Então guria… Hic! Que merda passa na tua cabeça para ficar… Hic! Aterrorizando aquela pobre vila? – Tork indagou em meio a seus soluços e goles demorados de cerveja.

- Você sabe… Meu irmãozinho vive me expulsando do barco, agora havia me entregue àquele prefeito quando visitou essa cidade pela última vez, ia me fazer casar com aquele baixinho velho e esquisito que vive em cima de uma tartaruga! Me revoltei, fugi e comecei a reunir uma tripulação para pegar um barco e ter meu primeiro navio! – ela torce o nariz – Hunf! Mas não passavam de bebês chorões, não tinham espírito pirata!

- Vendida como escrava… Entregue para casar com um estranho… Realmente não gosto disso! Que Nimb esteja rolando dados para um caminho bom! – disse Leon terminando sua segunda caneca – Tem certeza que ele voltará para este porto não é?

- Sem dúvidas, desde que viemos parar neste lado do mundo ele fez aliança de proteção à cidade em troca de porto livre, descontos e impostos! Ele deve vir pelo menos uma vez ao mês, e hoje equivale ao dia em que ele aportou e me vendeu há dois meses…

Então veio o som do sino. Um badalar alto, breve, rítmico e poderoso.

Indicava o quanto o sol havia andado naquele dia, marcando os horários,vindo da Igreja da Paz no Mar, união de Grande Oceano e Marah. Rapidamente alguns marujos levantaram-se e saíram para as ruas, enquanto outros se entreolharam e dispersaram-se mais pela taverna examinando cada cliente minuciosamente, o próprio taverneiro os focou sutilmente analisando os movimentos estranhos. Leon Galtran percebeu que algo estava para começar.



A brisa do mar esvoaçavam os longos cabelos roxos presos por uma bandana listrada e uma trança. O sobretudo agitava-se violentamente com o vento, enquanto isso os homens movimentavam-se ágeis por trás da figura daquele grande homem que descansava um pé na proa do navio. Seus olhos miravam sua vítima, e seu sorriso sádico zombava dela. O convés estava até vazio, uns três cuidavam das cordas e velas, enquanto outro aguardava no ninho do corvo e o navegador cuidava do timão. Os outros dez homens estavam um deck abaixo, organizando a pólvora e canhões. Nada poderia, nem iria falhar naquele dia. O capitão pirata ergueu-se ajeitando o sobretudo vermelho posto sobre os ombros e andou pelo imenso deck de seu navio.

- Hoje é o dia de lembrar a essa cidade quem somos! Não quero falhas, pois se alguém o fizer irei fazer andar na prancha mais podre das que usamos para apoiar na carga, mas não antes de arrancar-lhe os olhos! A reputação desta tripulação nunca será manchada, então preparem-se! AMAINAR! GIRAR MEIA ONDA EM SENTIDO BORESTE PELA BUJARRONA! EXAMINAR BOMBORDO!

Neptunio Wood se aproximou do capitão com seu sonoro som da perna esquerda de pau batendo contra a madeira do casco. Era baixo, com sangue anão em gerações passadas, bem constituído, bigode farto, bochechas cheias, sobrancelhas praticamente ligadas e usando uma toca de lã. Era o imediato do navio, cão fiel do capitão e um de seus maiores amigos, adquirindo sua posição na tripulação após demonstrar sagacidade incomparável em liderar combates navais e salvar dezenas de vezes a grande nau de rochedos iminentes. O capitão o observou, aumentando o sorriso malicioso que parecia blasfemar a honra da cidade a sua frente.

- Capitão, a pólvora já foi socada, os homens estão começando a mirar! Aguardamos seu comando!



James K. vertia sangue por dentro de sua íris brilhante. O sangue de suas vítimas.

- Lembrem-se, velho, apenas de prestar atenção aonde ordenei que atirassem! Não quero exageros, nem que destruam outros pontos vitais da cidade!

O som do sino soou pelas ondas e o capitão segurou uma gargalhada, entregando-a em uma ordem.

- ATIRAR!!!!!!!!!!!!
O imediato avisou ao deck abaixo dando três pancadas no chão do convés com sua prótese.



 

Enquanto isso, no cais principal da cidadela portuária, sequer era percebido o movimento do pirata. O fiscal responsável pelas docas, Breno Buffavino, continuou caminhando e anotando o nome dos navios que recém-chegavam. Era um halfling robusto, de meia idade, cabelos ralos e parcialmente grisalhos, usando uma boina e trajes do mar desbotados com um colar de prata cravado por uma esmeralda, revelando sua posição ali. Apesar do tamanho, sua voz elevava-se bem alto e mantinha respeito dos humanos milicianos. Seus pés ágeis o transportavam pela madeira gasta do píer, chapinhando nas poças de água salgada e por entre as centenas de pernas que iam e vinham de marujos e viajantes que embarcavam e desembarcavam, tudo sem escapar de seus olhos. Ele gesticulava, apontava, bradava e corria. Era sua vida, movimentada, como poucos de sua raça gostavam, mas que fornecia bons lucros. Graças a ele que os milicianos podiam cobrar as taxas de ancorados com perfeição, prender embarcações que tentavam burlar as regras do porto, ou enviar navios que já haviam passado da cota dos impostos. Um fiscal auxiliar, este humano, apareceu, era mais um especialista em avisar os navios que se aproximavam, vigiando o horizonte com uma luneta. Ele sorriu enquanto espiava a nau ao longe.

- O que encontrou de engraçado, Jophann? – o halfling indagou anotando algo na prancheta e apontando de um miliciano para um homem que se esgueirava suspeito na turba.

- Ele voltou na hora, chefe Breno, a Bravado está no horizonte! – o jovem fiscal humano de não mais que vinte invernos e cabelos revoltos sorria com seus dentes podres pelo mal trato que tinha com eles.

Breno Buffavino respondeu à alegria, sempre recebera gorjetas muito boas daquele pirata. Bárbaros escravizados, especiarias, famílias com grana escoltadas das ilhas da baía, mercadorias, tudo que levava ao tal bucaneiro ser bem recebido naquele lugar, mesmo apesar do título e fama dos mares distantes. Breno mal podia acreditar que aquele homem pudesse ser um demônio. Defendia a cidade de males vindos do mar que antes cobravam grandes custos com heróis, agora só pela oferta de benefícios em trocas comerciais na cidade e porto seguro tinham mais eficiência e possibilidade de financiar o mercado que só crescia, boatos levavam a crer que o capitão James K. do belíssimo galeão encanhonado se tornara um dos melhores corsários da história. Não sabiam o quanto estavam enganados…

O halfling correu até a ponta do píer junto a seu auxiliar, examinou com a própria luneta a nau ao longe e disse:

- Ela pode ancorar no píer 5! Está livre e reformado! Mas… Esper… Por que a Bravado parece estar virando? E o que é aquela coisa vindo em nossa… Pelo Grande Oceano! ESTAMOS SOB ATAQUE!!!!!!!

Em seguida ao alarme do fiscal, que chamou a atenção de todos quando largou a prancheta e começou a correr no meio da turba, uma bola imensa de chumbo vinda em alta velocidade atingiu a doca, destroçando o píer, o casco de um navio, esmagando várias pessoas e explodindo em alto e bom som ao atingir uma estrutura. James K. iniciara seu ataque, seja lá por que motivo fosse. O caos tomou conta do porto, caixotes foram jogados a esmo, navios começaram a partir, às vezes chocando-se a outros também apressados, a milícia confusa e inexperiente, típico do interior, apenas fugiu em direção a cidade e logo a doca era atingida por mais três balas de canhão atiradas pela Bravado.


A mão azulada bateu contra a mesa de madeira envernizada com um estrondo alto. Os olhos do humanóide escamoso de descendência marítima tinha seu semblante contorcido em uma irritação profunda pela idiotice daqueles à sua volta. Fidalgos, não valorizavam as ações de seus antepassados e eram uma ofensa à inteligência de qualquer um.

- Volto a reafirmar-lhes, não podemos aceitar novamente que ele entre e saia desta vila como se fosse qualquer um! Vocês do mundo seco podem pensar naquelas coisas douradas, contudo, para mim não são nada além de um pedaço de coral sem vida, e assim posso enxergar a verdade!
Os outros riram das palavras do elfo-do-mar que voltou a sentar-se frustrado com a falta de noção dos demais que se reuniam envolta da grande mesa pentangular de madeira. Os que estavam ali eram netos dos cinco aventureiros que fundaram aquela cidadela portuária, e portanto, os conselheiros regentes: Andriäa, a meio elfa, filha da arqueira élfica vinda de Lenórienn, Bellemarriï, com Rother, o Paladino; Juramanttes, descendente do casal guerreiro anão Balder e Dreyah; e Conde Pupknot, um humano pequeno pelo sangue do halfling do grupo que fundara a cidadela. Os três haviam há muito aceitado o elfo-do-mar para ajudar na proteção costeira já que seus antepassados convidaram-no para tal, contudo, não viam nele a ambição necessária para participar do conselho.

- Ora ora, Conselheiro Unnil, talvez seja exatamente isso o que lhe falta… - Pupknot sorriu por baixo de seu denso bigode negro enquanto ajeitava o monóculo de prata - …A ambição de nosso mundo para então assistir ao progresso!

- Mesmo que estejamos comerciando com um profanador dos Oceanos? – Unnil grunhiu com os olhos vermelhos de nervoso, sentia sua ira lhe escapar pelos poros. Os milicianos destacados para zelar pela segurança de cada um naquela cúpula apertavam com força suas lanças caso fosse necessário repreender o “estrangeiro do mar” – Eles não são indesejados apenas em meu mundo submerso! Lá eles lançam destroços do Mundo Seco! Mas no de vocês eles destroem! Foi pela proteção da costa que me tornei conselheiro, senhores!

Andriäa bocejou, abriu um leque para afastar o calor e o tédio enquanto um serviçal ajeitava as jóias em seu colar para manter a vaidade intacta. Juramanttes bufou, deu uma cuspidela em um vaso próprio para isso, ajeitou a roupa aristocrática e disse sem cerimônias.

- Errado, senhor Conselheiro Unnil, ao que me consta tornou-se conselheiro apenas por gratidão à construção do farol que facilitou tanto a nós quanto a vocês que tiveram menos navios naufragados em suas terras submersas! – palitou os dentes amarelados para tirar a comida que deliciara-se ainda a pouco – Uma lenda dos mares oestes protegendo nossa costa como um cão nosso, em troca de mercado, ouro e taxas é bastante vantajoso! Sabe quanta coisa esses hobbits de Hongari nos forneceram para proteção das naus que trafegam pela Baía dos Náufragos? Nada… Nada mesmo!

O elfo iria replicar quando houve um estouro provavelmente próximo da estrutura pela altura do som de explosão e o tremor que sentiram. Juramanttes caíra no desequilíbrio e resmungou erguendo-se.

- Mas o que está acontecen… - os quatro milicianos na câmara adiantaram-se para abrir a porta como meio de fuga quando algo zuniu e uma bala de canhão entrou pela porta aberta, atingindo a mesa de reuniões e explodindo, jogando os conselheiros contra as paredes que começaram a rachar e desmoronar. O elfo-do-mar conseguiu manter-se de pé com sua resistência e espiou por entre a cortina de fumaça com odor de pólvora, encontrando ao longe, no caminho de destruição da bola de chumbo, a silueta de um navio. O maldito começara como previra…

Subitamente o humanóide com traços de peixe agarrou seu tridente de aço que ficava preso à parede do conselho, mas que agora estava no chão depois da mesma desabar, saltou sobre o entulho ignorando os fidalgos soterrados ou feridos, que logo seriam socorridos por seus criados e milicianos que chegariam, e disparou a correr em direção ao porto para impedir que o local que o acolheu acabasse mais destruído.


- Estamos cercados!

- Hunc! Obrigado pela informação óbvia! – Tork incomodou-se com o comentário de Leon.

Primeiro foi o sino que fez com que alguns estranhos saíssem do estabelecimento e outros espalhassem-se lá mesmo disfarçadamente, depois veio o som de uma explosão que fez cada caneca tremer. E as lâminas brilharam quando os homens estranhos revelaram-se piratas da tripulação da Bravado. As pontas dos sabres eram ameaçadoras, principalmente para uma cidadela tão pacata quanto Talinthar aonde quase nenhum aventureiro mais experiente andava. Luigi lembrou ao grupo em sussurros a fama no lado oeste do continente que havia sobre aqueles homens, exímios em esgrima. Havia até alguns que portavam armas de pólvora e miravam nos que consideravam mais perigosos.

- Devia ter imaginado… - disse Anne que escondia o rosto nas mangas para que nenhum marujo da tripulação do flibusteiro a reconhecesse - …o Irmãozinho tem a chata mania de atacar os portos que faz aliança de tempos em tempos de maneira a deixar bem claro que não está a serviço de ninguém! Na maioria das vezes é com cidades que dependem dele de alguma maneira, como esta, que mesmo no caso dos governantes locais acharem melhor afastar-se do irmãozinho, não encontrariam grandes vantagens, por ele ser a única opção de grande proteção, e sem contar que quebrar o contrato resultaria a um saque constante e não de longos períodos!

Leon Galtran estava pasmo com a frieza e funcionalidade do plano.

- Realmente não gosto deste seu irmão!

- Hunc! Não gosta já? Então espera conhecê-lo…

- SILÊNCIO! – bradou um dos tripulantes invasores que lhes apontava uma pistola e um sorriso sádico.

Os piratas examinavam o grupo com interesse e desconfiança. Sabiam que não eram locais e sem dúvidas eram aventureiros estrangeiros pelos trajes e armas que portavam, sem denotar a presença do trog com uma foice mecanizada entre eles. Luigi de braços erguidos então disse.

- Calar um bardo? Heh! Difícil hein!

Com a perna ágil, o bardo bateu com o joelho sob a tábua de uma das mesas da taverna fazendo-a ir pra frente. Já conhecendo aquele movimento há muito tempo, Leon pegou-a e ergueu, usando para proteger-se dos tiros que vieram. Enquanto os bucaneiros recarregavam as armas de longa distancia, jogou-lhes a mesa. Anne de pronto correu em direção a uma janela, barrada por piratas de espada em punho, contudo, foram problema temporário quando a lâmina do “machado” de Tork cortou o ar a distância preso por uma corrente ferindo aqueles que puseram-se no caminho. Rapidamente Leon agarrou Anne, saltou pela janela e evadiram por ruas mais estreitas. Os piratas dentro do local então correram para cima do troglodita enquanto Luigi irrompeu pela porta de saída com uma ombrada, tendo tiros em seu encalço, mas que desviaram-se milagrosamente sem sequer raspar-lhe na roupa. Livre de afetar qualquer um do grupo, o troglodita rugiu bárbaro para todos os malditos homens do mar.

- Peguem essa lagartixa nanica!

- Hunc! Falou a palavra mágica, seus putos!

E de seus poros saltaram os fortes gases fétidos providos por sua raça, empesteando e fazendo todos caírem nauseados quando não inconscientes sobre os próprios vômitos.



As ruas de Talinthar estavam uma loucura… As balas de canhão choviam sobre a cidadela, com intervalos a cada três projéteis que explodiam casas incendiando-as ou direcionadas a pontos principais como delegacia e prisão. As pessoas desesperadas buscavam socorro em meio às ruas, quando mal imaginavam que piratas já infiltrados na cidadela surgiam de todos os pontos, entradas e saídas da cidade portuária barrando fuga, roubando os cidadãos, invadindo as casas, saqueando e arrastando as mulheres mais belas pelos cabelos com sadismo enquanto perfuravam os peitos dos entes mais queridos e corajosos que se atreviam a tentar impedi-los. Gritos de desespero, o odor dos tiros de pistolas nas praças, sangue inocente sendo espalhado, as gargalhadas pérfidas, o tilintar dos butins, o choro das crianças, mulheres e maridos… todo aquele caos espalhava-se sobre a cidade que há décadas não sofria tal pesadelo.

 

O capitão James K. respirava fundo agraciado por toda aquela sinfonia que sua querida Bravado e tripulação causavam enquanto descia do bote que Neptunio remara até o porto. As pessoas e marujos dali já haviam sido expulsas dos navios e reunidas sob o fio das espadas de alguns de seus comandados que sorriram em reverencia ao capitão que trazia seu casacão sobre os ombros pelo imenso calor que estava. O lendário bucaneiro respondeu rindo e penetrando nos olhos de cada um ali com suas íris de demônio.

- Tremam, marinheiros de primeira viagem… - ele bradou com sua voz de diabo sobre os homens acuados do porto. Outra bala de canhão caiu ali próximo com alto estrondo e destroçando toda uma taverna de baixa qualidade com os que ali refugiaram-se – Não irei matá-los, quero que espalhem por todo o leste o que viram aqui! HAHAHAHAHAHAHAHAH!

E assim caminhou com seu imediato em direção ao pátio principal da cidadela, admirando o estrago que causara. Era o plano ideal. Desde que aquela praga de cajado mágico da elfa, que o assombrava a vida mesmo após estar definitivamente morta, ter teleportado sem motivo aparente todo o navio com a tripulação para aquele lado do mundo, calculara cada passo que daria tanto para solidificar seu mito por aquelas bandas, como para arrecadar cada vez mais impostos das cidadelas pacíficas. Os conselheiros de Talinthar não tinham mais a quem recorrer proteção, afinal, a única base mais próxima era Triunphus, como lhe alegaram os informantes, um meio urbano amaldiçoado e atacado por um monstro demoníaco que a fazia carecer de toda força militar possível.

Seus passos eram como os de um gigante, não que fizesse sons abomináveis, mas sua presença fazia a alma de cada um ali gelar, tanto de medo quanto de raiva por ter traído a confiança daqueles que lhe oferecera porto seguro. As ruas e seus ratos calavam-se na sua presença, as crianças que tentavam chorar eram logo silenciadas por seus pais nem que por pouco tivessem que sufocá-las. Não desejavam mais ira daquele ser que caminhava com sua aura de asas de morte. O capitão pirata cessou sua andança em frente à imensa estátua que trazia esculpida a imagem dos cinco aventureiros que há muito fundaram aquele porto, e que agora deviam estar corados tamanha desonra dos seus descendentes. O pirata ajeitou o sobretudo vermelho sobre os ombros e sentou-se de pernas cruzadas aos pés dos heróis da estátua.

Com um gesto o imediato Neptunio adiantou-se para organizar que todos os piratas que recolheram um butim, trouxessem o ouro, prata e outras preciosidades, derramando-as em monte à frente do capitão. Realmente, já recolhera mais tesouros, todavia, não podia esperar mais que um pequeno monte de moedas, castiçais, espadas e outros materiais trabalhados a ouro. Um novo gesto e as mulheres amordaçadas e amarradas, de crianças à idosas, foram levadas a ele. Ergueu-se e caminhou.

Seus olhos abomináveis corriam pervertidamente cada curva, traço e vestes das mulheres. Sentiu o aroma do pescoço de algumas crianças, acariciou mais ousadamente outras mais jovens e bateu com a parte cega de um sabre que trazia entre as pernas daquelas mais tímidas. Ao fim fez um aceno para as que lhe interessavam.

- Serão vendidas ao sul… São boas mercadorias! – as mulheres choraram, e cessaram quando lâminas quiseram arrancar suas cabeças de sobre os ombros – As outras deixem, poderão fazer mais filhos, ou seja, financiamento de mercadorias para nós! Não quero estupros, sabem que não quero almofadinhas bastardos me procurando por vingança de sangue e nem mulheres apaixonadas, pelo que têm entre as pernas, vindo se alistar para pisar em meu convés! Depois usam o ouro desses miseráveis nos inúmeros bordéis das costas!

O capitão gargalhou desumano dando as costas às reféns, até que sentiu um cuspe atingir-lhe com a força de um nojo e escorrer com o calor de um ódio. Toda a praça gelou e calou-se naquele momento, até deu-se o intervalo das explosões de bolas de canhão. A própria culpada de tal obra blasfêmica evadira o sentido das pernas levando-a ao chão, momentos antes do aço frio do sabre lépido perfurar-lhe pela traquéia destroçando todos os órgãos guardados nas costelas e depois ter a cabeça dividida no meio enquanto o capitão recolhia a arma para com um pano descartável limpar o sangue e os resíduos de carne na lâmina. Alguns tentaram dar um grito de pavor, porém, mesmo suas vozes temeram mostrar-se. James K. sentou-se novamente aonde estava antes e embainhou o sabre, em seus lábios… um sorriso.

- Que fique bem claro, beldades, e demais reféns… Qualquer um dos cativos… Se desrespeitarem o seu senhor aqui, farei-lhes de exemplo como o fiz com esta mulher corajosa… E farei isso sorrindo! – os olhos brilharam intensos e insolentes – Agora levem esta pobre mercadoria sacrificada para ser alimento dos selakos daqui, pelo menos será uma carcaça com coragem! HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH!!!

Neptunio conhecendo o capitão, pegou uma garrafa de rum, abriu a tampa com uma parte de aço sobressalente em sua perna de pau e entregou-lhe, que bebeu com sede. As mulheres foram retiradas de pronto, algumas seguradas por capangas da Bravado quando suas pernas fraquejavam ante ao medo do que acontecia e viria a acontecer em suas vidas. Então vieram os homens a serem expostos de peito nu. James K. examinou os músculos, dentes, cada parte do corpo e assim definiu aqueles que seriam os próximos a serem vendidos como escravos e quem entraria para sua tripulação.

- Este matou dois de nossa tripulação quando pegamos sua filha, capitão… - disse um dos piratas com seu sorriso banguela por anos de escorbuto.

- Hmmm… Forte, corajoso e capaz de derrotar dois de meus homens! Vai entrar para a tripulação e trabalhar pelos dois que matou!

O cidadão caiu aos pés do capitão aos prantos, aquela montanha de músculos se decompôs a sua frente como se esfarelasse à brisa do mar.

- Senhor… Não… Lhe peço… M-minha família! Sou peixeiro de meu bairro… S-sustento minha família pobre… Minha mulher e… e… e filha não têm condiç…

James K. pegou-o pelo colarinho e ergueu até seus olhos fazendo o espírito do homem escapar-lhe pelas retinas ante o pavor.

- Pssi!!! Não pedi para contar a história de sua família, seu bosta! Já pro navio! Estará a disposição de minha tripulação para o que precisar e se for nem que seja um pouco lerdo, todos têm a permissão de estripá-lo e fazê-lo andar na prancha! Não necessariamente nesta ordem!

- N-n-nã-não!!! Minha família!

- Este é o problema? Ok, sem problemas… Neptunio, quero a cabeça de cada membro da família de nosso novo tripulante pendurada no mastro central por três dias para que este homem não tenha mais pelo o que sofrer pelos outros e possa matar as saudades enquanto conhecerá a nova família dele em nosso convés cheiroso! Hahah!

E assim o imenso homem foi arrastado com resistência em direção à Bravado que ancorava no porto não muito longe dali.

- Bom, bom… Vamos lá! Vou dividir o dinheiro, preciso que esta cidade tenha o mínimo para se reerguer e assim possa vir aqui de novo daqui há alguns anos saqueá-la novamente!

Enfiou o sabre no ouro e separou um terço de tudo, chutando para longe do butim de verdade. Logo que terminou, dois corpos de piratas caíram dos céus na frente do capitão que saltou para trás já de sabre em punho. Os corpos estavam com três furos no peito e sangrando pelos olhos. O olhar de James K. seguiu para o telhado e viu o motivo daquilo. Lá estava um elfo-do-mar de olhar vingador e intimidador mirando-lhe enquanto girava um tridente sobre a cabeça.

- Hah! HAHAHAHAHAH! Então um peixinho fugiu do aquário e quer brigar…

- Prepare-se, abissal do mundo seco, estou incumbido de proteger cada cidadão, e farei pagar por cada lágrima e sangue inocente derramado!!! – Unnil bradou de cima de um telhado antes de saltar com um grito de guerra único capaz de ser reproduzido apenas por cordas vocais de sua raça.

James K. apenas lambeu os beiços molhados de sarcasmo.



Os saltos do ladino eram invejáveis, mas os de Anne não ficavam para trás. Por mais que doesse em Leon ver talentos de ladinagem em crianças, tinha de reconhecer a destreza da garota. Neste momento saltavam sobre os telhados das casas de Talinthar enquanto chovia virotes de bestas e tiros das armas fedorentas de pólvora dos piratas que os perseguiam. Seus pés teimavam em querer escorregar nas telhas de barro ou espetar nas de palha, contudo, não praguejavam, sabendo que o mínimo erro lhes custaria a vida. Anne, que escondia o rosto em uma bandana, agarrou uma pedra pesada que segurava a palha e jogou na direção dos piratas para atrasá-los. Os olhos de Galtran correram pelo mar de telhados à frente até o porto, então com perícia única segurou a mão da menina e a puxou.

- Vamos despistá-los! Acho que vi uma rua sem saída!

Logo que falou Anne soltou um berro, puxou o ladino e caíram do telhado segundos antes de onde estavam ser atingido por uma imensa bola de chumbo que veio zunindo como a morte e explodiu a casa em chamas e fumaça fedorenta. Estavam em meio a um beco, encurralados por cinco piratas. Sabres, pistolas preparadas e virotes.

- É… Agorarealmentelesvãonosmataragorarealmentelesvãon… Ai! – Leon gritou de dor quando a menina aplicou um chute em seu calcanhar.

- Parece que burrice é coisa de família! – ela disse emburrada.

Ouviram um clique de uma garrucha engatilhando.

- Mas é claro… Leon Galtran, reconheceria esta sua carinha maltrapilha em qualquer canto! Heheh! – disse o pistoleiro ruivo com cabelo penteado de forma engraçada, que lhe fazia parecer ter espinhos vermelhos na cabeça – Lembra-se de mim? Desde aquela vez que matou meu companheiro ao roubar o templo principal de Tibar no Reino de Fortuna, entrei para a tripulação de James K. para no meio criminoso te achar! Agora fique quietinho enquanto pego sua cabeça para ficar rico! Gahahahah!

- Nem a pau, Menelau!

Leon olhou para trás e viu uma parede bem sólida, conseguiria escapar com facilidade se estivesse sozinho, mas a pequena Anne provavelmente ficaria para trás. Resmungou algo e com a boca ajeitou as luvas que trazia em suas mãos, estas com pouco atrito e quentes, lhe permitindo uma velocidade incrível e prestidigitação destra, assim, quando veio o primeiro disparo, agachou, enfiou a mão em seu bolso e retirou um punhado de pequenas bombas famosas pelo nome de pérolas explosivas.

- Prepare-se para correr em direção à eles!

- Mas o que… - Ela tentou saber qual era o plano, porém a ação foi feita rápida demais.

Leon jogou as pérolas em direção aos piratas que assustados atiraram a esmo. Galtran jogou-se com a menina no chão para escapar, algumas das balas, ainda com pólvora chamuscada atingiram as pérolas em pleno ar desencadeando uma enorme explosão que derrubou a casa ao lado que já havia sido abalada com a bala de canhão que atingira a estrutura vizinha. Os tripulantes da Bravado foram arremessados para trás pelo impacto da explosão, quando não explodiram eles mesmos por causa dos usuários de pólvora. Em meio a fumaça, corpos e destroços, Leon agarrou o punho de Anne e puxou-a pulando sobre as ruínas das casas e assim dando um salto para alcançar o telhado de outra próxima, despistando por completo os capangas de James K.

Após um breve momento perceberam… A Bravado não disparava mais balas de canhão, cessara plenamente, e ao longe, começava a ancorar no porto. Galtran sorriu enquanto também observava a escassa milícia local ser rendida pelos piratas.

- Vamos Anne! Temos que nos infiltrar no navio do teu irmão e esperar pelos outros!



Não demorou muito para Tork alcançar Luigi Sortudo. Os dois estavam perdidos em meio a profusão de ruas que aquela cidade portuária tinha. Não só por que não haviam passado por ali ainda nenhuma vez na vida, como por que a maioria das ruas estavam repletas de restos de construções explodidas, quando não corpos. Os piratas também amontoavam-se de todos os cantos perseguindo os dois. Eram muitos membros dentro daquela tripulação, o que já é esperado da maior nau de todo Mar Negro, capaz de rivalizar mesmo com os navios dos marinheiros peritos minotauros do reino de Tapista. O bardo tinha seu florete em mãos e brandia-o contra os sabres sob bela maestria, mirando nas mãos oponentes para desarmá-los e depois rendê-los. Eram hábeis também, bem treinados como se devia esperar daquela tripulação, contudo, Luigi fora mosqueteiro imperial da corte do Imperador Rei Thormy em tempos que lhe foram memoráveis. O bardo conseguiu alguns cortes contra seus ombros, enquanto o trog aliado apenas girava o corpo liberando a lâmina bizarra de seu “machado”, cortando as armas de pólvora. Um de sabre lançou-se contra o humanóide baixinho, mas este defendeu com o corpo de sua arma, acertou-o entre as pernas com a extremidade e aplicou-lhe uma mordida no braço direito do oponente separando-o do corpo em uma cena horrenda.

- Esses filhos da puta não param de aparecer! Já estamos chegando? Hunc!

- Não sei caro companheiro Trog! Heh! Vou tentar arrumar um guia para nós!

O bardo então correu em uma velocidade incrível, como se seus pés deslizassem pelo chão até aplicar um golpe com o punho do florete contra o abdômen do último pirata que lhes barrava a saída. Depois com o mesmo ao chão vomitando todo o rum que bebera, Luigi pegou seu bandolim e tocou duas notas que foram ecoando nas ruínas das casas envolta que se incendiavam com as crepitantes brasas das balas de canhão que atiraram antes. As notas vibraram em bela melodia que entraram nos ouvidos do homem caído que já enfraquecido mal percebeu sua consciência abandonar-lhe, sendo totalmente subjugado pelo ritmo. Luigi diminuiu o tom da música e ajoelhou-se próximo de sua vítima.

- Meu caro flibusteiro sanguinário, leve-nos pelo caminho mais rápido até o convés de sua embarcação!

E o tripulante logo se ergueu com os olhos mirando o vazio, enquanto caminhava para frente em direção ao porto. Luigi mantinha seu sorriso bobo enquanto Tork resmungava arrastando as tripas de um pirata que arrancara pra comer.

- Magias… Não quero nada com essa putaria!



O tridente zuniu e passou nem mesmo perto do capitão que com uma esquiva simples desviou e já lhe estocava o sabre. Unnil odiava batalhar no mundo seco, principalmente sob o sol quente da tarde, quando sentia as escamas que encobriam seu corpo secar e grudar desconfortavelmente. Até mesmo jogara toda roupa fora, ficando somente de tanga para o calor não lhe atrapalhar mais. Viu a lâmina vindo em sua direção, mas sempre era fácil desviar por causa da distancia que o tridente lhe permitia ficar do oponente, ainda que a agilidade do mesmo fosse incrível. James K. lançou-se para trás e ouviu os disparos de seus subordinados. As balas ricochetearam na estátua.

- IDIOTAS!!! Quem mandou se intrometerem? Andem, levem nosso butim para o navio! Eu mesmo vou chutar a carcaça desse baiacu!

Os três dentes do enorme garfo vieram em sua direção girando. Com um golpe vertical do sabre a arma de haste atingiu o chão prendendo, e logo James K. saltou sobre o oponente para perfurar-lhe a garganta com o sabre. Unnil deslizou os pés molhados caindo no chão com um baque temeroso, esquivando do homem, puxou o tridente e acertou com a haste o flanco do capitão que logo recobrou o equilíbrio com destreza.

- Belo movimento!

Unnil não achava tempo para bravatas, pois os homens da Bravado já levavam os cidadãos e o tesouro da cidade para a nau. Investiu novamente, contudo, não foi feliz no trajeto. James K. esquivou-se novamente, passou a perna sob a haste chutando-a para cima de maneira a atrapalhar o elfo e logo seu sabre fez um belo corte no ombro esquerdo do ser dos mares que deixou seu sangue vermelho e quente espirrar diante da imensa dor. O capitão pirata zombou do mesmo lambendo o sangue de sua lâmina e cuspindo depois como se fosse um catarro. Focando o olhar demoníaco saltou na direção da vítima que se não fosse bem hábil bloqueando na hora o sabre com uma pedra, teria sua cabeça trespassada. Os piratas que ficaram para dar suporte ao capitão apenas observavam o eminente massacre, seus sorrisos podres e carniceiros já percebiam que a carne do elfo-do-mar lhes seria servida ao anoitecer.

- Chega de brincadeiras, moleque azul! – disse James K. desembainhando outro sabre com a mão livre – Está na hora de levantar ancora e zarpar!

Como o vento que sopra desavisado, o capitão surgiu sobre o combatente do mar com seus sabres em lâmina cruzada como uma tesoura. O elfo impediu usando a haste do tridente aparando, empurrou contra o pirata jogando-o para trás e girou o corpo para a extremidade inferior dar uma rasteira no capitão que apenas saltou e estocou os sabres lhe abrindo a carne escamosa na face e coxa direita.

- Malditos do mundo seco! Eu fui acolhido nesta cidade quando não havia mais lar para mim nas areias submersas! Escapei de um tirano e jurei proteger este povoado! – com um brado estocou o tridente que mal deu tempo de James K. escapar, bloqueando com as duas espadas entre os dentes da arma, porém, tal foi o impacto que mesmo com toda força em seus pés, foi arrastado para trás.

- Por que a maioria dos com que luto têm a chata mania de querer contar a história de suas vidas!?

Até o momento o capitão havia só brincado com o ser marítimo, há muito não tinha uma boa batalha, e esta não era das melhores também.

Irritado com a demora, deu um chute sob o tridente, adicionando um impulso com as lâminas que prendiam o garfo do tridente, jogou a arma pro alto abrindo a guarda do elfo-do-mar que para escapar e não cair no chão pelo desequilíbrio, teve que soltar a arma, logo o capitão já estava sobre ele e com agilidade os sabres fizeram cortes profundos nos membros e no lado direito do peito do elfo em uma velocidade incrível, que apenas aquele conhecido como o maior dos espadachins em todo Mar Negro era capaz de realizar. Assim Unnil foi ao chão, derrotado e imobilizado pelos lugares atingidos. James K. deu-lhe um chute.

- Sobreviva verme! Você tem bons músculos e ótimas idéias, como a do farol que puseram nesta cidade como meus informantes me noticiaram! Você deve viver e proteger essa cidade para que ela prospere até meu retorno! Não ouse morrer…

Embainhou os sabres, fez um gesto para Neptunio e saiu andando com os piratas que ainda estavam no pátio, indo em direção ao porto. O imediato, acompanhado por dois tripulantes fortes, pegaram o elfo-do-mar e carregaram-no para os degraus do templo de Lena, aonde já estavam os outros conselheiros feridos como planejara e calculara o capitão. Unnil deixou uma lágrima escapar pela derrota. Uma lágrima de desonra… e ódio…



Os vultos apoiaram seus ombros na murada do navio e tão ágeis quanto furtivos, rolaram para o convés molhado da Bravado, ocultando-se entre baldes e cordas. Alguns piratas iam e vinham, uns deitados molengas, outros vigiando as redondezas, havia os que conversavam em palavriados e gírias do mar e outros que iam e vinham com homens e mulheres de todas as idades, quando não alguns barris cheios de ouro. Estes últimos entravam e saíam dos respiradouros com pressa, como se quisessem terminar logo o trabalho.

- São muitos! Ainda bem que a corda de ancoradouro é bem resistente, senão seria bem difícil de chegar aqui!

- Sim! Será que o bardo está chegando com o Tork?

Fungaram juntos e fizeram cara de nojo.

- Yikes! Isso não pode ser só o cheiro dele!

- Não, tio Leon… Arghh! Isso é simplesmente o cheiro de um navio cheio de homens por meses… Logo a gente se acostuma!

Leon rastejou silencioso até atrás da escada que levava pro castelo da proa, e escondido nas sombras retirou uma bandana que trouxe escondido no bolso, roubada de um dos tripulantes nocauteados quando estavam sendo perseguidos. Anne apenas manteve-se oculta enquanto o ladino erguia-se resmungando e caminhando até os demais tripulantes para disfarçado infiltrar-se.



- Heh! Da maneira que afirmei, caro companheiro Trog… nada que um bom guia não resolva!

- Hunc! Mas por que tínhamos que vir de peito aberto de frente para eles?

Os tripulantes da grande nau já estavam terminando de guardar todo o carregamento de suprimentos e butim direcionado à Bravado, quando de repente ouviram a bela melodia. Tentaram compreender de onde vinha, nenhum no navio tocava instrumento musical com tal majestade… Foi então que despertaram ao ver surgir as três figuras. Um troglodita anão, fedido, com um peitoral de aço e trazendo uma foice ensangüentada, um bardo sorridente, com os olhos cobertos por um chapéu de abas longas que lhe obscureciam os olhos e um dos próprios piratas que vinha a frente, guiando-os, sem piscar, de olhos revirados, totalmente tomado pela mente por magia. Quando alcançaram as escadarias de pedra que levavam ao píer de ancoramento os pistoleiros e manipuladores de bestas começaram a disparar seus virotes com velocidade contra os três. O tripulante foi o primeiro a ir ao chão perfurado por todas as partes, os outros dois caminhavam juntos, negligentes e intactos, por algum motivo nenhum disparo os atingia.

- Que merda é essa? Usou magia, bardo? – Tork indagou preparando a foice caso fosse necessário e já mostrando os dentes sujos de tripas e sangue abundante misturado a baba o que fez alguns piratas hesitarem.

- Heh! Digamos que agora sabe por que me chamam de Luigi… Sortudo!

O músico então puxou a última corda de seu bandolim com o dedo na casa certa, puxando a corda no momento exato para a vibração sair em um alto estrondo que tomou o ar e tornou-se uma explosão sonora que arrancou algumas tábuas do chão e lançou alguns piratas para dentro d’água.

- Homens, não temam! Capturem-nos e suas cabeças serão entregues ao capitão! SAVY????

Todos responderam com um brado desembainhando as espadas e lançando-se de todos os cantos para cima dos dois ali. Tork sentiu seus poros se abrirem, mas não tinha gás nenhum mais para gastar com os bucaneiros. Sem dúvida aquele bardo era louco. Quando os homens do mar também já haviam descido do convés, ouviram um som alto de madeira arrastando. Os inúmeros no píer olharam para trás e viram um dos seus e uma menina recolhendo a rampa de subir para convés. Alguns começaram a preparar suas armas de longa distância.

- MOTIM!!! CAPTUREM!!!!

- Heh! Tolinhos…

Aproveitando a distração, Luigi continuou a melodia e puxou novamente a última corda de maneira que o ar vibrou alto de novo ensurdecendo as dezenas de cabeças que ali estavam e arrancando alguns do chão pelo golpe. A Kailash zuniu capturando outros e jogando-os na água antes da arma mágica voltar à mão do ladino. Tork adiantou-se com fome de tripas, entretanto, Luigi parou-lhe, tinha um plano. Leon retirou a bandana e logo alguns boquiabertos bradaram.

- OLHEM!!! MALDITOS!!!! ESTAMOS SENDO ROUBADOS POR ELE!!!!

- SIM!!! RECONHEÇO ESSA CARA EM QUALQUER LUGAR!!!!

- Hunf! Kobolds me mordam… Lá vem eles de novo… Odeio me expor… - disse Leon cansado de ouvir as mesmas coisas sempre que o reconheciam.

- Pensa bem, tio! Pelo menos é famoso! – Anne riu ainda escondendo o rosto.

- É A CABEÇA POR UM MILHÃO DE TIBARES!!!!

- O MAIOR CRIMINOSO DO REINADO!!!!

- É O…

- MAS QUE BUDEGA É ESSA????







A última voz soou alta e ecoou poderosa sobre todo o porto, afrontando a resistência do vento e a alma de cada um. O silêncio tomou conta de cada canto, e assim James K. caminhou com suas botas estalando na madeira rangente e podre do porto, nada nem ninguém atrevia-se a emitir qualquer som ali. O próprio demônio dava seus passos em direção à Bravado. Observou a destruição do píer quase estilhaçado, a Bravado sem a rampa, seus tripulantes cortados e muitos jogados na água, o homem no navio, o estranho músico de chapéu emplumado e então detectou a coisa fedida.

- Espera aí sua coisa verde… Eu te conheço… Pera… Não creio…

- Hunc! Fala pirata de merda!

Um arrepio correu a espinha de cada tripulante ao ouvir o insulto ao capitão que cerrou os dentes de raiva. James olhou atentamente pra quem estava em seu convés, até que ouviu de um tripulante que falara sem agüentar o nome.



- O que? Galtran? Sério? HAHAHAHAH! Espero que seja você mesmo aí, e não outro filho bastardo! Se bem que aquele rouba nem barquinho de papel! O que vocês querem em minha nau, suas pragas?

Leon puxou Anne e colocou uma adaga em seu pescoço como combinado, a menina debateu-se nervosa, representando bem. James K. ao ver a irmã arregalou os olhos, abriu a boca e seus piratas jogaram-se na água como se ele fosse virar um dragão vermelho ali mesmo e cuspir as labaredas chamuscantes das profundezas do inferno. Seu urro de ódio foi mais gutural, sonoro e poderoso que qualquer monstro da distante ilha pré-histórica de Galrasia foi capaz de dar.

- O que queremos? Heh! – Luigi sorriu bobo – Uma pequena carona para o sul encontrar um amigo! Ah, e também que sua querida irmãzinha saia viva e você com parte do ouro que conseguirmos! Somos pessoas caridosas não é?

- Não é nada não, mas… Hunc! Pela cara dele de quem não bebe muita cerveja ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


Ñota do autor: Tem gente lendo e não comentando, peço gentilmente que postem, mesmo comentarios não agradaveis, pois nem dou muita atenção a contos e romances com pouco comentários!

ASS: ANTONYWILLIANS, O MAIOR ESPADACHIM DE ARTON

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