O Festival de Benthos
(Parte 1 – A Morte de Thomas Lendilkar)
Fogos de artifício estouraram nos céus, alguns mágicos moldavam-se na forma de grandes dragões que voavam sobre a turba cercados por ondas multicoloridas de estalos antes de se dissiparem. Havia barracas por todos os cantos, com guloseimas, artesanatos, frutas e diversões. Não era raro ver a imagem dracônica presente em bonecos de pelúcia ou madeira, em tapeçarias ou trajes vendidos nas barracas de tecidos, ou mesmo feitos de açúcar. Havia dezenas de crianças que corriam fantasiados de colonos e monstros marinhos, havia até competição da melhor imitação. Era incrível como os comerciantes eram capazes de transformar a catástrofe em produtos, e os políticos transformar em lembrança vívida por séculos.
Na avenida principal da grande capital Roschfallen uma parada de Cavaleiros da Ordem da Luz prosseguia como um cortejo portando tochas em memória aos inocentes mortos na grande catástrofe de quatro séculos atrás. Eles seguiam de olhar sério e queixo erguido em nome de seus ancestrais enquanto os clérigos de Tanna-toh entoavam a ladainha melancólica pelo caminho das almas que pereceram em nome da antiga missão civilizadora. Os nobres seguiam às varandas e terraços de suas grandes e luxuosas casas admirando a parada de longe, em meio à suas famílias e intrigas. O sentimento do arrependimento, da tristeza e do grande erro cometido pelos ancestrais misturava-se a bebidas, risadas e todo tipo de diversão. Era no mínimo…
- Deveras curioso! – disse Vladislav com as mãos dentro das grandes mangas do manto negro enquanto descia as escadas de pedra da destacada Biblioteca de Aurinos, aonde estivera desde que chegara fazendo anotações em dezenas de pergaminhos que Tarso carregava às costas.
O necromante e seu serviçal morto-vivo eram uma atração na grande festa, primeiro pela raridade de conjuradores arcanos no reino, em segundo que normalmente eram mais conhecidos nas histórias infantis ou lendas, e aparecendo geralmente como vilões combatidos pelos Cavaleiros da Ordem... E em terceiro, por que a maioria desses magos malignos eram necromantes. As mães afastavam os filhos para longe do homem de negro que ali andava. Vlad achava aquilo engraçado, muitos ali de fato sequer o conheciam e deviam saber da Grande Academia Arcana apenas por rumores contados por bardos blefadores. Simplesmente manteve-se em seu porte, em um passo contínuo enquanto usava seu cetro de maneira nobre. Seus olhos admiravam e guardavam cada imagem e cena que lhe permitia assistir. Seguia a busca de Katabrok e Tasloi que estavam pelo grande festival.
...
Roshfallen foi o ponto que o necromante resolveu iniciar a busca, não só por ter a Biblioteca de Aurinos, extremamente conceituada no reino aonde poderia buscar informações acerca de Lendilkar, como também era ali que ocorreria o Grande Festival de Lendilkar, uma festa popular organizada anualmente no mesmo dia em que há quatro séculos a antiga capital foi engolida pelo mar durante a ira do Rei dos Dragões Marinhos, Benthos. O festival relembrava a toda a população o peso da tragédia como uma conseqüência à invasão sem precedentes que Bielefeld tentara contra o reino arquipélago de Khubar. Naquele dia, Benthos, protetor das ilhas, foi desperto de um profundo sono, e afundou toda a antiga capital junto a parte da costa, embarcações e o próprio fundador do reino.
Não demorou muito e logo a primeira peça de teatro encenando os momentos trágicos apareceu, várias crianças e casais reuniam-se ali para ver a história de seus antepassados, comentando as novidades e erros dos próprios artistas. Enquanto torres eram colocadas de um lado e halflings de preto balançavam um lençol azul de outro para similarizar o mar, um homem pegou uma cadeira de almofadas e sentou-se na ponta do palco trazendo um alaúde no colo. Era um homem nobre, de trajes elegantes, barba curta e branca, cabelos grisalhos em ondulações belas, farto bigode, usando um peitoral de aço com o símbolo da ordem da luz, e com a espada embainhada a cintura. Ele preparava-se para a nova encenação. Vlad de pronto encontrou o corpanzil de Katabrok misturado a todos com o Tasloi sentado em seus ombros para assistir sobre toda aquela multidão.
- Evidentemente interessante… - disse o necromante se aproximando do bárbaro – Após a verificação em alguns tomos, subjeto que seja conveniente uma encenação acerca! Só me indago das proposições desse cavaleiro da Ordem estar ali pronto a entoar a história!
Meia dúzia de palavras não foram compreendidas por Katabrok, como normalmente acontecia, mas sorriu para o mago, cruzou os braços e voltou a atenção para o grupo circense que começava a encenar enquanto o cavaleiro nobre começava a narração.
- Senhoras e senhores! Meninos e meninas… A história que vêm ouvindo até agora é de como nosso reino sofreu tal catástrofe e como a antiga capital foi levada ao fundo do mar! Eu vos trago uma nova… Esta narrará a história de meu tataravô e seu companheiro anão, dois grandes amigos que sobreviveram ao grande desastre… Nossa história começa no ano de 1037, no amanhecer do mesmo dia de hoje… Quando há 363 anos atrás a maior frota de colonos jamais vista em Arton, e liderada por nosso herói Thomas Lendilkar tomou a frente do mar para a conquista do mundo que acreditávamos ser bárbaro!
(Parte 1 – A Morte de Thomas Lendilkar)
Fogos de artifício estouraram nos céus, alguns mágicos moldavam-se na forma de grandes dragões que voavam sobre a turba cercados por ondas multicoloridas de estalos antes de se dissiparem. Havia barracas por todos os cantos, com guloseimas, artesanatos, frutas e diversões. Não era raro ver a imagem dracônica presente em bonecos de pelúcia ou madeira, em tapeçarias ou trajes vendidos nas barracas de tecidos, ou mesmo feitos de açúcar. Havia dezenas de crianças que corriam fantasiados de colonos e monstros marinhos, havia até competição da melhor imitação. Era incrível como os comerciantes eram capazes de transformar a catástrofe em produtos, e os políticos transformar em lembrança vívida por séculos.
Na avenida principal da grande capital Roschfallen uma parada de Cavaleiros da Ordem da Luz prosseguia como um cortejo portando tochas em memória aos inocentes mortos na grande catástrofe de quatro séculos atrás. Eles seguiam de olhar sério e queixo erguido em nome de seus ancestrais enquanto os clérigos de Tanna-toh entoavam a ladainha melancólica pelo caminho das almas que pereceram em nome da antiga missão civilizadora. Os nobres seguiam às varandas e terraços de suas grandes e luxuosas casas admirando a parada de longe, em meio à suas famílias e intrigas. O sentimento do arrependimento, da tristeza e do grande erro cometido pelos ancestrais misturava-se a bebidas, risadas e todo tipo de diversão. Era no mínimo…
- Deveras curioso! – disse Vladislav com as mãos dentro das grandes mangas do manto negro enquanto descia as escadas de pedra da destacada Biblioteca de Aurinos, aonde estivera desde que chegara fazendo anotações em dezenas de pergaminhos que Tarso carregava às costas.
O necromante e seu serviçal morto-vivo eram uma atração na grande festa, primeiro pela raridade de conjuradores arcanos no reino, em segundo que normalmente eram mais conhecidos nas histórias infantis ou lendas, e aparecendo geralmente como vilões combatidos pelos Cavaleiros da Ordem... E em terceiro, por que a maioria desses magos malignos eram necromantes. As mães afastavam os filhos para longe do homem de negro que ali andava. Vlad achava aquilo engraçado, muitos ali de fato sequer o conheciam e deviam saber da Grande Academia Arcana apenas por rumores contados por bardos blefadores. Simplesmente manteve-se em seu porte, em um passo contínuo enquanto usava seu cetro de maneira nobre. Seus olhos admiravam e guardavam cada imagem e cena que lhe permitia assistir. Seguia a busca de Katabrok e Tasloi que estavam pelo grande festival.
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Roshfallen foi o ponto que o necromante resolveu iniciar a busca, não só por ter a Biblioteca de Aurinos, extremamente conceituada no reino aonde poderia buscar informações acerca de Lendilkar, como também era ali que ocorreria o Grande Festival de Lendilkar, uma festa popular organizada anualmente no mesmo dia em que há quatro séculos a antiga capital foi engolida pelo mar durante a ira do Rei dos Dragões Marinhos, Benthos. O festival relembrava a toda a população o peso da tragédia como uma conseqüência à invasão sem precedentes que Bielefeld tentara contra o reino arquipélago de Khubar. Naquele dia, Benthos, protetor das ilhas, foi desperto de um profundo sono, e afundou toda a antiga capital junto a parte da costa, embarcações e o próprio fundador do reino.
Não demorou muito e logo a primeira peça de teatro encenando os momentos trágicos apareceu, várias crianças e casais reuniam-se ali para ver a história de seus antepassados, comentando as novidades e erros dos próprios artistas. Enquanto torres eram colocadas de um lado e halflings de preto balançavam um lençol azul de outro para similarizar o mar, um homem pegou uma cadeira de almofadas e sentou-se na ponta do palco trazendo um alaúde no colo. Era um homem nobre, de trajes elegantes, barba curta e branca, cabelos grisalhos em ondulações belas, farto bigode, usando um peitoral de aço com o símbolo da ordem da luz, e com a espada embainhada a cintura. Ele preparava-se para a nova encenação. Vlad de pronto encontrou o corpanzil de Katabrok misturado a todos com o Tasloi sentado em seus ombros para assistir sobre toda aquela multidão.
- Evidentemente interessante… - disse o necromante se aproximando do bárbaro – Após a verificação em alguns tomos, subjeto que seja conveniente uma encenação acerca! Só me indago das proposições desse cavaleiro da Ordem estar ali pronto a entoar a história!
Meia dúzia de palavras não foram compreendidas por Katabrok, como normalmente acontecia, mas sorriu para o mago, cruzou os braços e voltou a atenção para o grupo circense que começava a encenar enquanto o cavaleiro nobre começava a narração.
- Senhoras e senhores! Meninos e meninas… A história que vêm ouvindo até agora é de como nosso reino sofreu tal catástrofe e como a antiga capital foi levada ao fundo do mar! Eu vos trago uma nova… Esta narrará a história de meu tataravô e seu companheiro anão, dois grandes amigos que sobreviveram ao grande desastre… Nossa história começa no ano de 1037, no amanhecer do mesmo dia de hoje… Quando há 363 anos atrás a maior frota de colonos jamais vista em Arton, e liderada por nosso herói Thomas Lendilkar tomou a frente do mar para a conquista do mundo que acreditávamos ser bárbaro!
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As nuvens se fechavam sobre o grande cenário. Uma névoa sorrateira cobria as águas enquanto o clima quente fazia os homens suarem correndo disparados pelo grande porto. As enormes torres de pedra da capital Lendilkar eram testemunhas da formação de uma das maiores frotas que seriam enviadas para as ilhas bárbaras, de maneira a estabelecer feitoria em seu centro. Navios pequenos e grandes eram preparados para a navegação iminente. Os ferreiros traziam em grandes carroças barris e caixotes repletos de armas que seriam usadas na grande infiltração que iniciava aquele dia. Vários navios já estavam em alto-mar, iniciando a primeira frente. Enquanto isso o jovem anão Thombardin e o paladino de Tanna-toh, sir. John Merle, aprontavam-se no grande navio que levaria os principais heróis fundadores do reino e seu séquito mais confiável. À frente, na proa estava Thomas, o lendário fundador que guiou a caravana de colonos de Valkaria àquela costa que chamavam de Bielefield, tornando-o um dos reinos mais desenvolvidos até então.
A embarcação rangia como um monstro sedento por carne enquanto ia se afastando do porto, balançando bastante pelas ondas revoltas daquele dia. O anão apertou o punho entorno do grande machado de guerra e abaixou o elmo dourado com formato da cabeça de um lobo de maneira a proteger-se da água salgada que toda hora respingava em seus olhos. Cofiou a densa barba negra falando temeroso ao companheiro humano que terminara suas preces.
- Sinto minhas juntas doerem… Isso é um mal sinal, humano!
O mesmo deu algumas tossidas e firmou os pés encarando o mar que sumia sob os cascos de tantos navios. O paladino mirou a grande capital, de torres e muralhas que iam ficando para trás, enquanto a névoa sorrateira que flutuava sobre a água do mar começava a adensar e envolver a nau. Sabia que as juntas do companheiro era um oráculo, sempre anunciando maus presságios, como quando os bárbaros organizaram uma armadilha e quase renderam toda capital… ou quando estavam nas florestas e o troll invadiu a gruta que estavam, por pouco não levando suas pernas à mordidas.
- Deve ser essa névoa esquisita e esse calor que está lhe causando isso! Estamos indo para o meio de selvagens, não iríamos querer um mau agouro, neh? – disse ponderando e tentando esquecer as palavras do companheiro para que não se preocupasse mais.
O paladino ajeitou nas mãos suadas as luvas feitas do couro de um búfalo selvagem, e caminhou com o companheiro até diante do navio. Thomas, um homem de idade madura, olhar desafiador e digno, trazendo seus dois martelos de guerra pequenos e encantados presos à cintura, encarava o horizonte.
- Vamos voltar!
Sua voz grossa foi como um soco em seus companheiros aventureiros, inclusive para Thombardin que escutou sonoramente.
- M-mas porque? Estamos quase lá, é a maior frota já enviada neste continente… - a sua própria prima, uma poderosa arcana que fazia também parte do grupo, protestou. Era uma mulher linda, principalmente para o anão, pois ela tinha um corpo gordo, ainda que de simetrias perfeitas, olhos brilhantes de felina e cabelos fogo. A mesma mostrava-se indignada - …Não é só porque minha adivinhação previu ondas e tempestade que devemos voltar! Se o tempo virar eu ainda posso proteger ao menos nosso nav…
- Não, Morian… Não sinto boas energias hoje, ser teimoso contra esse tempo pode nos causar problemas! Consultei os oráculos sagrados da Grande Fênix antes que seguissem para o norte e nós embarcássemos! Eles viram uma arma poderosa que seria usada pelos selvagens! Não sei o que pode ser tão perigoso, mas todas as noites acordo por causa de pesadelos em que homens usando máscaras de ossadas de baleia cantam algo blasfemico… Lendilkar tem comerciantes capazes de comprar sua alma e cobrá-la a todo momento, ou navegadores capazes de atravessar um redemoinho sem fazer uma curva, mas não temos clérigos suficientes para espantar uma praga ou uma maldição!
A maga emburrou, odiava ser contestada. Abruptamente encostou na murada do navio e apontou o dedo gordo na cara do primo herói.
- Mesmo que nós voltássemos…
- Não discuta! Nossa família…
- Está segura em Lendilkar! Os deuses Hedryll e Tanna-toh guardarão nossa capital e civilização! Eles nos deram uma missão, estão do nosso lado… A Justiça e a Razão! Pare de temer o futuro que nunca foste disso, e vamos montar as feitorias que irão dispersar a civilização nas ilhas que nos serão grandes portos!
Thomas calou-se, o resto do grupo não pensava em se colocar entre os primos. Brigas e discussões entre os dois eram comuns, mas normalmente era Thomas que convencia.
...
Cerca de meia hora havia passado, e já estavam na metade do mar que divide o continente das ilhas. A nau em que Thomas, Morian, Thombardin e Sir John Merle estavam já estava na metade do caminho, as ilhas maiores destacavam-se com seus imensos vulcões em erupção ininterrupta, as montanhas titânicas elevavam-se como as costas de um grande crocodilo que dormia oculto na grande mata fechada de coqueiros e estilos tropicais. Os ventos não estavam bons, nem a água. Os marujos corriam afobados para todo canto, fatigados pelo calor inoportuno daquele dia e tentando dar o melhor para os navios chegarem com segurança.
- As correntes estão mudando a cada segundo… Os ventos sopram aleatoriamente! Eu não estou entendendo este clima!
Isso era escutado em todos os navios, não havia uma única embarcação que vez ou outra não se via virada para direções inversas ao do arquipélago. Seriam os povos de Khubar capazes de manipular o clima? Possivelmente não, nunca o fizeram. Talvez arquipélago adentro até houvesse xamãs poderosos, mas não ali na borda. Thombardin secou a barba negra encostado no mastro, suas juntas chegavam a arder de dor. Não era para estar assim, não era tão velho para tal. Sua preocupação aumentou foi quando os ventos pararam, assim como o mar. Não havia um sopro ou uma corrente em todo o mar, os navios ficaram a deriva instantaneamente.
- Será alguma maldição? – proferiu o clérigo de Khalmyr magrelo do grupo de Thomas Lendilkar, era um homem que mais aparentava com um abutre, servindo à justiça desarmado. Apesar do físico de minhoca era capaz de socos capazes de quebrar paredes graças a seus treinamentos em monastérios.
- Eles estão escapando! – na torre de vigia, o tripulante no ninho do corvo usava sua luneta espiando as diversas canoas que escapavam da ilha mais próxima – E tem ilhéus enfileirados na costa olhando para nós!
- Ai, minhas juntas! – o anão tombou.
Ao ver o parceiro, o paladino veio correndo assisti-lo. O anão tremia intensamente, logo sir John o envolveu com a própria capa.
- Quer me matar de calor, humano burro! Tire essa capa… - se debateu tirando a capa - …Seja o que for, virá agora! Minhas juntas não deixam eu nem fic… Ué! Passou…
O anão levantou sem problemas e pegou o machado, não sentia mais nada.
- Seja o que for, creio não ter volta, companheiro! Não sei que praga esses tribais lançaram sobre nossas embarcações, contudo, eles serão dizimados por isso, eu juro! Acham que nos deixar a deriva os salvará!? Pois sabemos nadar.
Os dois seguiram até a proa e tentaram avistar a praia ao longe, mas era quase impossível. A névoa quente que corria sobre as águas ficara para trás no continente, mas também envolvia as ilhas, só viam com clareza os outros barcos envolta, de pessoas confusas. Alguns já pegavam canoas para desembarcar e seguir até a ilha em missões aventurescas para impedir a possível magia. Foi quando uma corrente começou a puxar os navios de novo, dessa vez para o lado. Algumas embarcações mais próximas colidiram.
- Mas o que agora? – Thomas irritou-se e adiantou pegando um grande cabo de madeira usado para afastar o barco do píer e colocou em histe sobre a murada do navio, entendendo, os outros repetiram pegando alguns também ou segurando o mesmo para aumentar a força e assim distribuíram-se por todo navio. Quando se aproximava uma embarcação os cabos batiam no casco do mesmo, de maneira a manter uma distância segura.
Cada vez a corrente aumentava sua velocidade, e logo foi percebido quando de um navio a outro bradavam.
- REDEMOINHO!!!!!!!!!!!!!
O desespero foi total, alguns homens começaram a jogar-se direto na água para tentarem escapar com os próprios braços. Em cada navio os homens desciam aos decks para pegar grandes remos usados para emergências como essa. Tentavam com a força dos seus braços escapar, mas era quase inexpugnável a corrente. O redemoinho apresentou-se, enorme, grandioso como uma boca sem dentes sugando os navios para seu interior como se fosse uma besta faminta. Lendilkar ao longe tocava sinos de alarme que eram escutados abafados nos navios. O som da água sugada para dentro do oceano era algo medonho, como se tivessem despertado uma grande fera que chupava a água e engolia as enormes embarcações com o brasão de Bielefeld como se fossem pequenos grãos.
- Oh, santo Heredrimm! – disse Thombardin golpeando o casco do convés de maneira a não escorregar nas poças de água para fora do navio.
O paladino companheiro segurava-se a uma corda grossa ao mastro enquanto o navio virava perigosamente para o lado como se fosse virar.
- Será este Caribdes? A fera devoradora de navios???
Um marujo escorregou, agarrou em um barril de puxou. A cena não foi das melhores. O engradado caiu abrindo a tampa e dezenas de lanças pontiagudas penetraram-lhe o rosto, pescoço e ombros, e assim seu corpo caiu batendo na murada do navio e desabando na água. Morian colocou o pé direito no mastro central, concentrou-se e proferiu antigas palavras que fizeram ventos saltarem da mesma, deslocando-se para as velas e empurrando-as para longe das correntes.
- Lufa arthan embagh!
Thomas Lendilkar imediatamente correu e salvou um guerreiro que atrapalhado com a armadura, tropeçara nos próprios pés e por pouco não caíra na água aonde afundaria sem chance de retorno. A embarcação afastou-se da corrente que engolia a frota e levou o impacto de vários outros navios próximos.
- Maldição! – Sir John Merle proferiu assim que a corrente destruiu os remos do navio em que estavam.
- Morian, leve com seus ventos mágicos para a ilha! Vamos parar essa loucura com as próprias…
Tudo parara novamente. Silêncio letal, ou assim parecera brevemente. Então algo que nunca haviam escutado, ainda que diversas vezes nas missões colonizadoras em alto mar tenham ouvido os mais guturais cantos das baleias, esse foi terrível. Um rugido como que vindo de um inferno d’água ressoou por todo o mar estremecendo o convés e incomodando os ouvidos. Em resposta, no exato local em que estava o redemoinho, implodiu um forte estouro d’água salgada do mar que ergueu-se como uma lança ou coluna azul que subiu com pressão em direção aos céus voltando a puxar os navios próximos.
- Praga! O que é isso? Esses bárbaros não possuem tanto poder para tal! – proferiu o ladino do grupo de Thomas que tomava a frente.
A água perfurava as nuvens e giravam-nas tornando-as de um cinza claro a um negro forte. Logo em seguida a água arremessada nos céus chovia salgada sobre os navios, ensopando ainda mais os convés dos navios que estavam a salvo da corrente da coluna d’água. Thomas mordia o próprio lábio de nervoso do que viria a seguir.
- Thombardin, retire já sua armadura! – bradou Sir John Merle em meio ao tumulto da chuva e zoeira.
- Tirar minha armadura? Tá louco homem? Aaaah! Da próxima vez dê atenção às minhas junt… CUIDADO!
O anão deu um encontrão no abdômen do companheiro tirando-o da reta de algo que se chocou contra o chão em um estrépido alto. Era um corpo de guerreiro ainda na armadura, morto, que caíra dos céus e ao chocar-se no convés espalhou sangue e por pouco não perdeu a própria cabeça.
- Homessa! – Sir John reclamou dando um chute no corpo para a água.
- PROTEJAM-SE!!! – Thomas Lendilkar bradou correndo para as cabines dentro do castelo da popa.
Tudo que fora sugado pelo redemoinho, era arremessado agora pela coluna d’água e caía sobre as ilhas e embarcações. Fossem os próprios navios, mastros, armas, barris ou corpos. Os navios que caíam sobre outros, esmigalhavam os tripulantes no mesmo instante que afundavam a embarcação dos mesmos. Os barris caíam rasgando velas, destruindo lemes e matando pessoas. O caos estava instaurado. Logo ventos quentes assolaram junto da chuva e giraram em trombas d’água que surgiam entorno de toda a frota. Novos barcos, a remo dessa vez vinham da capital ao socorro dos sobreviventes antes que fossem levados pelos tufões d’água que estavam surgindo. Sem as armaduras Thombardin e Sir John dispararam para as canoas da embarcação. Thomas os viu e percebeu que era o modo mais rápido de deter o que quer que os nativos estivessem provocando sobre eles. Imediatamente fez um sinal a prima maga e o resto dos companheiros para que pegassem um bote. Um novo rugido, esse mais próximo fez uma taquicardia em cada um nos navios. Sentiram-se paralisados e sem fôlego por instantes, marujos foram ao chão. Alguns entregavam-se a loucura chorando desesperados por suas vidas. Novos redemoinhos vieram, menores de tamanho, mas não menos perigosos. Até que uma sombra surgiu sob todos no grande mar. Era maior que uma baleia, talvez maior que todo um grupo delas. Era titânico, colossal no mínimo.
A coisa emergiu. Era uma fera como nunca se viu igual. Uma besta gigantesca, medindo centenas de metros, reptilinea com corpo enorme e massivo com enormes barbatanas emergindo das laterais da cabeça e corpo, assim como as grandes asas com a mesma forma. A fera rugiu aos céus enquanto cada movimento criava ondas que engoliam vários navios de uma só vez. Os nativos que tinham fugido sabiam do perigo, pois a simples aparição fez com que as costas das ilhas próximas fossem lambidas pelo mar, inclusive os nativos que ficaram foram levados junto a árvores.
- Pelas barbas justas de Hedryll, é um dragão aquilo??? Nunca vi algo sequer parecido em Lamnor! – bradou Sir John que observou Thomas boquiaberto e tão vidrado no ser que sequer reparou na prima que caíra ao chão de olhos arregalados e petrificada.
- Ou em Doherimm! Não é a toa que minhas juntas doíam tanto…
Thomas ficou ajoelhado diante da sua prima por uns instantes, sem conseguir acordá-la e confuso, ergueu-a nos braços e se pôs na mesma canoa que o paladino e o anão. Sir John sobrepôs as mãos no corpo da maga rezando à velha deusa em busca de acudimento, mas nada… Não havia vida a ser restaurada. Com um aceno do rosto revelou a verdade ao herói que engoliu em seco e disse áspero.
- Sigamos para a ilha, quero que ao menos seja enterrada e não bóie como mais um corpo fruto dessa catástrofe.
Era fato que seu ódio pela fera era implacável, por sorte se mantinha em razão, afinal, o que adiantaria nadar até a criatura se sequer teria tamanho para lhe aparar a unha? Manteve-se acariciando as mechas da prima morta enquanto seguiam para a costa. A visão envolta era aterradora. A besta marinha destruía as embarcações com uma facilidade incrível, bastava um golpe da pata e grandes naus tornavam-se nada mais que um punhado de madeira. Magia foi conjurada de cada navio, bolas de fogo, correntes de raios e mísseis de pura magia vieram de todos os lados atingindo a besta, explodindo em luzes e fogo, mas sem sequer arranhá-lo. Com um movimento da cauda um pouco mais forte e golpeou o litoral de uma ilha próxima jogando areia para o alto e desfazendo todo formato do litoral. Um novo rugido, mais mortos de pavor. Maremotos, trombas e colunas d’água, redemoinhos… A frota em pouco tempo estava quase totalmente dizimada.
O grupo estava no litoral da ilha que foi lambida pelo mar e onde antes estavam os xamãs devorados pelas águas salgadas. A terra ainda estava fofa e cheia de poças, assim como troncos de árvores tropicais estavam derrubados para todos os lados misturados aos escombros das antigas moradas dos mesmos. Thombardin jogou-se na terra molhada fatigado, enquanto Thomas e seus companheiros cavavam um buraco fundo para Morian. Sir John enterrara a espada na terra enquanto orava à Tanna-toh em busca de esclarecimento do que fazer naquele momento. Enormes raios alvejaram os últimos navios, assim como eram sugados pela força da água. Praticamente toda imensa frota de Bielefeld estava aniquilada sem terem causado um arranhão sequer no dragão colossal que surgira. O grande mar em frente a Lendilkar se fazia em uma cena de devastação sem precedentes, pois entre os fenômenos climáticos típicos de um cataclismo a madeira dos navios e corpos amontoavam-se por toda parte. Um navio jogado pelos ventos girava a esmo próximo da ilhota. Thomas ergueu-se e foi até o paladino pondo-lhe a mão no ombro.
- Senhor, vossa santidade, peço perdão por interrompê-lo! Mas seguirei de canoa até aquele barco em que as poucas almas que ainda existem devem ter perdido a sanidade já… Peço que faça um funeral digno à minha pobre irmã e depois siga para o interior dessa ilha! Que haja sobreviventes! Eu morrerei neste mar, pois não deixarei meus sonhos afundarem com a capital!
Sir John cofiou o farto bigode encharcado e cheio de areia e fez uma mesura.
- Que a Mãe da Palavra seja sua diplomata perante Hedryll!
Thomas agradeceu com um meneio de cabeça e partiu com seu grupo à canoa em direção ao navio. Ele até conseguiria manejar o navio, mas o que ocorreu em seguida apenas as lendas podem narrar. Enquanto isso, um enorme estrondo foi escutado quando novos maremotos deslocaram-se. Benthos erguia-se batendo as imensas asas-nadadeiras criando lufadas de vento que provocavam as tsunamis enquanto seu corpanzil abria uma fenda no mar para deslocar-se para o alto. O demônio, como parecia aos olhos de seus pequeninos oponentes, emitiu mais um rugido. Sugou o ar por instantes e soprou um poderoso cone de jato de água superaquecida que deixava um rastro de vapor capaz de descarnar a mais resistente das criaturas. Apesar da distância, o jato destruiu as maiores torres de Lendilkar que estava ao longe. O novo alvo do Dragão Rei era a cidade portuária de onde vinha todos os males causados pelo reino continental às terras que protegia como se fossem-lhe súditos incautos.
ASS: ANTONYWILLIANS, O MAIOR ESPADACHIM DE ARTON
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