quarta-feira, 12 de março de 2014

Em Busca de lenora - Capitulo II

HUNC!

- Realmente não sei o que passa na minha cabeça para aceitar vir em um bairro tão sinistro e repleto de criminosos dos mais vis! Meus pés estão chapinhando em mais lama neste lugar do que aconteceria no pântano mais encharcado! Já contei dez becos repletos de olhos e lâminas que nos espiaram todo o caminho! Sinceramente, seu pai ficará demasiadamente decepcionado com você por ter vindo, menina Petra!

Caminhando mais atrás do grupo, Klauskinsk vinha reclamando desde que fora convencido em escoltar a pequena Petra junto a Luigi Sortudo até um estabelecimento aonde poderiam encontrar mais facilmente o troglodita anão que lhes forneceria a ajuda necessária para a missão.

Mesmo conhecendo o mercenário monstro, famoso nas histórias narradas em vários reinos ao leste do Reinado, assim como já tê-lo visto algumas vezes bebendo e xingando pelos mais imundos bares, o bardo teria maior facilidade para atraí-lo com Petra a seu lado, mesmo tendo que aturar o mal-humor do elfo chato com odor de tequila que se recusava a deixá-la andar sozinha por tal lugar.

No momento caminhavam em uma rua estreita, cheia de buracos e poças d’água acumulada. O céu claro mal iluminava o local, sombreado pelos prédios enormes que o cercava, também criando becos aonde vultos espiavam qualquer transeunte, sem cessar. Em certo momento passaram por áreas de dignidade duvidosa, como prostíbulos, onde meretrizes acenavam para os dois homens, ou casas repletas de mal feitores que espiavam a menina incauta e sua sacola de moedas. Apesar daquilo, Luigi seguia com seu sorriso bobo cravado nos lábios sob as abas de seu chapéu emplumado. Após entrar na rede de ruas mal cuidadas e travessas sujas, passaram entre uma multidão de seres de todo tipo esquisito correndo desesperadamente entre eles. Momentos depois um odor pior que de flatulência de abutre instigou suas narinas e embrulhou o estômago, menos da jovem Petra que desde pequena sofria de disosmia e continuou respirando normalmente. Luigi pôs o braço na frente do nariz.

- Heh! Acho que encontramos o tal baderneiro! Petrinha, fique próxima!

A menina sorriu obedecendo enquanto ajeitava a capa mágica para evitar que encostasse na lama. Finalmente chegaram. Taverna Sorriso Banguela, uma casa de madeira velha e escura com as portas abertas. Ali o odor era pior, Klaus, com seu olfato apurado graças a vida de produção de poções, evitou afastando-se e pondo um lenço com perfume sobre o nariz.

- Por Wynna, que fedor! Nem os zumbis do porão na mansão do Mestre Vladislav fedem tanto! Arrghh!

Segurando a respiração com todas suas forças, Luigi se aproximou calmamente da porta e espiou o interior do estabelecimento. Estava escuro, alguns lampiões estouraram e haviam muitas pessoas desacordadas pelo chão, mesas, cadeiras e balcão, de repente um movimento, um estouro e novo fedor nauseante, só que de pólvora. Só deu tempo de se jogar em Petra indo ao chão quando um projétil atravessou a janela e perfurou a parede do muro ao lado.

- O que foi isso? – Petra perguntou coçando o ouvido que zunia com o barulho do tiro.

- Acho que o trog baixinho está resolvendo seus assuntos! – disse Luigi rindo e desafivelando seu bandolim.



A taverna estava uma bagunça. Mesas tombadas, cadeiras quebradas no meio da correria, comida e cerveja cobrindo o chão, bêbados desacordados, pessoas pisoteadas, garrafas aos cacos e um odor pestilento que levara muitos dos clientes a nocaute, formando um carpete de corpos nauseados e inconscientes. O chapéu negro e esfolado de Snizzel surgiu por trás do balcão, com seus olhos de íris em fendas verticais espiando sob as abas. Tantos anos produzindo e cheirando pólvora e várias outras substancias chamuscadas, levara parte de seu olfato, tornando-o parcialmente imune ao fedor do troglodita que lhe caçava. Preparado para um novo tiro, procurava seu alvo, sem muito sucesso, pois o mercenário era baixinho demais, se escondendo entre os entulhos com facilidade incrível. Erguendo-se um pouco mais, mal pôde desviar quando o trog saltou detrás do corpo de um meio-orc e subiu no balcão cortando o ar na horizontal com sua foice. Aparou o golpe com o flanco de sua carabina, empurrando a foice contra ele mesmo e aproveitando para disparar sua pólvora mal-cheirosa enquanto se afastava. Por azar, pisou em uma caneca, caindo no chão e atirando no teto. Tork sorriu com seus dentes ameaçadores e investiu com a arma. A distancia, disparou a lâmina. Presa por uma corrente ao bastão, se estendeu e fincou no chão próximo do homem serpente que levantou-se e preparou o próximo tiro.



- Nem ouse apontar essa porcaria para minha fuça, malandro! – o trog rosnou puxando a lâmina de volta, correndo na direção do oponente.

- Perdão, sssó posssso me divertir com você usssando-a! – o pistoleiro chiou saltando para trás e apertando o gatilho. Uma nuvem preta estourou na frente do cano disparando um projétil numa velocidade incrível que estourou antes de chegar à Tork.

A bala não era comum. Assim que explodiu em meio ao ar, soltou um aroma doce e irritante que penetrou na narina do troglodita fazendo-o espirrar enquanto seus olhos ficavam irritados.

- Hunc! Atchim! Hunc! Atchim! PUTAQUEPARIU! Que merda é essa? Atchim!

O homem-serpente sorriu, com a língua bifurcada dançando em sua boca de lábios falsos e fendidos.

- Meusss projeteisss sssão essspeciaisss! Hisss-hisss-hisss!

Com os olhos e narinas irritados, Tork abriu a guarda, apenas muito tarde para sentir a aproximação do inimigo que lhe cortou parte da crista com uma adaga.

- PORRA, NA CRISTA NÃO!

Ignorando os olhos que lagrimejavam, rodopiou em um golpe giratório que atingiu o flanco do oponente, mas apenas lhe rasgando o manto. Ainda cego, por pouco não teve a garganta trespassada por um tiro da carabina, pois antes de tal tragédia, um som muito alto abafou o estouro, levantou todo entulho e corpo espalhado pelo chão e desviou a bala em uma onda sonora. Era um som agudo que rompeu vidro e causou certa dor aos tímpanos de Tork. Uma mão tocou o rosto do troglodita que tentou morder por reflexo seja lá quem fosse, porém, sem sucesso. Foi quando ouviu a voz macia e carinhosa.

- Calma, Tork, agora estou aqui! Vou curar seus olhos! – a voz então falou com um eco arcano em seus ouvidos – Innova kárhinos!

Uma ardência subiu o focinho do monstro mercenário, causando uma dormência relaxante pelo caminho até alcançar os olhos e nariz fazendo-o voltar ao normal e enxergar com perfeição.

- GURIA!? O que faz aqui?

- Orasss, amigosss? – Snizzel sibilou ameaçador sobre o balcão apontando a carabina na direção dos dois.

- Deixa ela fora, rapá! – Tork rosnou colocando-se na frente de Petra que agachou atrás do amado parceiro.

Enfim veio o tiro, mas não encontrou algo, foi aparado por uma nova explosão sonora aguda quando Luigi Sortudo entrou no estabelecimento.

O bardo sorria bobo.

- Parece que teremos uma peleja antes! Vamos, caro Klaus…

- Homessa! Espero que pelo menos as tequilas estejam intactas!

Klaus ergueu as mãos sobre a cabeça, girou em torno do corpo e apontou as mãos na direção do homem serpente, saltando fios de teias de aranha da extremidade de seus dedos. Snizzel desviou com um salto, preparou um novo tiro e ocultou-se atrás de uma mesa, evitando a teia de grude mágico. Tork se pôs na frente de todos.

- Ae, cavalaria! O trog anão aqui pode cuidar desse filho da puta sozinho! Hunc!

Assim investiu sobre o homem serpente que deu um novo tiro. A bala estourou no ar liberando uma breve cortina de fumaça alaranjada que o trog inspirou, sentindo penetrar em suas veias. Veneno sem dúvidas. Ignorou, cortou ao meio a mesa que o atirador usava de escudo e avançou com uma mordida contra o cano da arma, arrancando-a da mão do oponente. Snizzel deu um salto para trás e pareceu crescer, arrebentando seus trajes e criando mais escamas pelo corpo. As pernas viraram cauda, as mãos viraram garras e logo era uma serpente imensa e humanóide com braços e um chapéu preto na cabeça. Abriu a bocarra disparando um jorro de veneno ácido. Petra correu e foi protegida por um frasco de poção que Klaus lançou perto dela. O ingrediente mágico em contato com o ar fazia uma barreira de fogo, protegendo-a por completo. Logo se virou, começou a mover os braços e proferir palavras arcanas. Tork estava irritado. Levou uma surra, pisou em cerveja desperdiçada e outras pessoas apareceram para meter pau naquele que ele mesmo queria fazer o sangue escorrer.

- Ah… To muito puto!

Saltou contra o mostro ofídio descendo a lâmina contra as escamas, raspando nelas sem penetrar. A cauda o atingiu jogando contra uma mesa que se despedaçou enquanto as mãos livres lhe apontavam pistolas retiradas de coldres do cinto preso à sua cintura, assim disparou ágil contra o mercenário.

- Nueva lombaridaraa! – Petra proferiu fazendo o ar queimar e uma bola flamejante voar em direção ao monstro imenso explodindo em faíscas abundantes. O inimigo chiou.

Tork sangrava um pouco no ombro esquerdo por uma bala que lhe atingira. A lâmina de sua foice, presa na corrente, silvou no ar, mas o homem-serpente conseguiu desviar, pegando a carabina e preparando um novo disparo. O troglodita saltou desviando do projétil letal e puxou a própria arma, fazendo a parte afiada retornar com um tranco e cortando o ombro do oponente que jorrou em sangue roxo. Com a lâmina de volta em sua foice, bateu com o equipamento no chão de forma que a ponta ficou na vertical, como uma lança, e investindo contra o ser bizarro lhe enterrou no abdômen até sair pelas costas. Snizzel fez seu chiado de dor ser ouvido há muitos metros dali, mas logo parou quando Tork abocanhou seu corpo ofídio, penetrando os dentes afiados fundo na carne de cobra e arrancando as tripas com um único movimento da cabeça. O pistoleiro serpente foi ao chão inerte com os olhos mirando a morte. Klaus não resistiu e vomitou em um canto da taverna com a cena. Petra fez uma careta ao ver o amigo com as tripas na boca, achava assustador. Anos atrás teria ficado em choque, por sorte as aulas de anatomia no seu curso de necromante na Academia Arcana lhe deu maior resistência à cena. O troglodita anão mastigou as tripas e engoliu antes de se aproximar dos três visitantes.

- Guria! – falou com Petra – Quem são esses caras, e o que fazem aqui?

- Papai mandou procurá-lo, o tio Luigi pensou que eu poderia ajudar a fazer você vir com a gente!

Ela abraçou o amigo, logo assistindo a seus ferimentos com uma pinça e atadura.

- Esqueceu quem sou? – Klaus perguntou limpando a boca com um lenço após vomitar.

- Hunc! Você é o pulha boiola que serviu o mago… To falando do guri da musica explosiva!

- Ora seu, nan… - Klaus se enfureceu com a ofensa, porém Petra lhe impediu.

- Heh! Prazer, senhor Tork! Ouvi falar muito sobre você em minhas andanças! Sou Luigi Sortudo, bardo companheiro de aventuras de Vladislav Tpish!

O troglodita ponderou após um palavrão quando petra apertou demais seu machucado. Acariciou a cabeça da menina com a garra. Eles tinham uma grande amizade há tempos, ela o salvara da morte uma vez e era uma das poucas pessoas no mundo que não o tratava como um demônio verde e fedido, apesar de às vezes achar que era um bichinho de estimação para ela.

- Hunc! Lembro de tu! O mago já falou de você! Afinal, o que querem comigo?

- Temos uma proposta! Queira nos acompanhar até o Solar Tpish!

Segurando o ferimento estancado, Tork guardou a foice, que chamava de machado, prendendo-a na parte detrás do peitoral de aço. Em seguida pegou o grande homem serpente pela cauda, dando a carabina dele para o bardo.

- Pode ser, devo uma pelo mago ter dado um trato em meu machado! Levo esse filho da puta para a milícia, vocês pagam uma guaroba ae, e sigo com vocês!

O troglodita baixinho saiu porta afora com olhar ranzinza e resmungando pela péssima luta que teve. Com o gosto azedo de tripas em sua boca, sentia que a merda estava só começando a feder.
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ASS: ANTONYWILLIANS, O MAIOR ESPADACHIM DE ARTON

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